2010-04-27
2010-04-14
Carícias Malícias
Saí do purgatório, fardado a rigor como em qualquer outro dia, e já em Lisboa sequestrei a casa de um amigo para trocar de roupa e me parecer ligeiramente mais com um ser humano.
Deixei o carro estacionado, fumei e antecipei coisas más pelo caminho, e acabei por chegar à praça onde tínhamos combinado o encontro.
Eu e os meus colegas de curso fazemos isto frequentemente. Combinamos uma jantarada (eles, mais resolutamente do que eu), bebemos uns copos (eu, em menor medida do que eles), queixamo-nos um pouco do trabalho, recordamos momentos dos antigamentes, insultamos os que não apareceram e procuramos um sítio para prolongar a noite.
Desta vez, a escolhida foi uma caixa de música no Cais do Sodré, onde um dj aparentemente meritoso, passava a música que havia de extasiar o resto da troupe e de me obrigar a mim, por fim, a recorrer ao álcool. Nestas alturas os copos servem dois propósitos: o da tolerância psicológica e o da intermitência física. O primeiro, toda a gente já o experimentou em alturas de menor predisposição para o que está a acontecer à nossa volta – bebe-se um pouco e, se a coisa der para o lado certo, ainda acabamos por nos rir um pouco. O segundo, é particularmente útil nos períodos em que os risos e sorrisos teimam em não surgir e se vai queimar uns minutos até a um bar apinhado – aparece-se e desaparece-se de ao pé dos foliões e espera-se que o próximo copo seja finalmente capaz de alinhar os espíritos.
Mas foi assim o resto da noite e o álcool pouco ajudou. Muita música má, muito bailarico e pouco estímulo.
Acabei por fazer as despedidas e decidi meter-me a caminho do cacilheiro, pois ainda que o meu espírito não estivesse alinhado com o dos meus parceiros, não o estaria certamente o da polícia.
Tirei bilhete, sentei-me na sala à espera do embarque, tirei umas fotos com o telemóvel e assisti durante meia hora às coreografias das gentes jovens da margem sul, até que os portões se abriram desimpedindo o acesso ao cais – aguardei um pouco, deixando passar em primeiro lugar os mais impacientes e saltitões, e levantei-me com o último terço da manada.
Estava no início da descida, caminhando em paço lento e vazio, quando senti uma mão acariciando-me a nuca. Em décimos de segundo pensei poder tratar-se de alguém meu conhecido com instintos furtivos e um desejo ardente; de um desconhecido que me tivesse confundido com o alvo da sua líbido; ou, mais provavelmente, de um rapaz com aspecto jovial à procura de alguém para uma sessão de estalada antes de ir dormir.
Foi esse o tempo que demorei a direccionar a minha cabeça e a encarar, por fim, uma grande negra que me olhava atentamente.
- Então,? gostas de mim? - perguntei com entoação querida e dengosa.
- Acho-te engraçado… - respondeu, não devendo nada ao meu afecto.
E assim fomos os dois, de braço dado, passo lento, descendo a rampa até ao barco que nos aguardava.
E não é que foi o melhor diálogo da noite?
2010-04-11
2010-04-09
- É chato porque se está estagnado;
- É bronco porque se está emperdigado;
- E é boçal porque se está embrutecido...
E depois vêm os padres a dizer e coiso que o correcto é coiso e existe o mal que é pecado e a indulgência impõem-se e bora lá todos dançar na discoteca que é escura como as trevas e igual ao inferno que se vive porque somos todos importantes para impressionar o mundo com o estatuto (óh palma deixa lá os clichés...).
Porque é lindo e faz uma redoma à volta do menino e é quiloze de mízetíco (leia-se místico), embora, para ser verdadeiro, possa dizer apenas que não tenho sono e as palhinhas do menino para mim só tenham interesse enquanto matéria orgânica, vulgo estrume...
Agora como há muitos anos (tipo o refrão da cantiga):
E com isto adquiri um sem número de expedientes que me fazem ter força para entoar o manguito ao próximo (porque quando não se conta não há desilusões - vai-se aprendendo...) e deliciosamente desfrutar dos aromas da solidão, naquele lugar comum que é desejar ter cabelos brancos e as carnes flácidas (mais do que agora) e encarar tudo isso com a naturalidade de quem entende que a sensualidade está no espírito e a secura de sentimentos é fértil num olhar que se forme espontâneo e natural!
2010-04-06
http://www.ted.com/talks/lang/por_br/chimamanda_adichie_the_danger_of_a_single_story.html